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A despropósito - Dezembro 2007

... por falar nisso, lembrei-me de reparar na evolução darwinista que tem decorrido os últimos 20 anos, nas transformações da sociedade, como o aparecimento dos telemóveis e o desaparecimento dos bairros no sentido comunitário... e de tanta coisa que me passou pela cabeça, fixou-se a ideia – pela sua centralidade na vida pública (ou somente por ter visto um autocolante amarelo numa caixa de correio) – do surgimento da guerra social do ”Publicidade, aqui não!”, guerra sem tréguas e já com elevadas vítimas em ambos os lados. Penso até que há um grupo de extremistas que faz da sua vida uma vigia constante à caixa de correio – imagino-os com um banquinho desdobrável, uma espingarda e um chapéu panamá verde seco – à cata de inimigos. Pessoas que odeiam solenemente todo o papel não endereçado que entra nas caixas de correio. Calculo que haja também os outros (ou pelo menos o ‘outro’, há) que fazem da sua guerra o ódio à existência de pessoas que “odeiam solenemente todo o papel não endereçado que entra nas caixas de correio”. Será que se vai gerar um movimento cívico? Far-se-ão autocolantes verdes a dizer “Autocolantes com a frase ’Publicidade, aqui não!’ aqui não!”. Não me incomoda a publicidade... incomoda-me antes que se deitem esses mesmos ou outros papéis para o chão (e eu nem moro num prédio), incomoda a falta de civismo, a falta de tolerância, e de educação, a arrogância... A mim, a publicidade na caixa do correio é benéfica! Alguns folhetos têm interesse, outros não, mas todos remedeiam o problema de infiltração da minha caixa de correio. Vou tirando o correio e deixando acumular no fundo as folhinhas do mestre astrólogo, da senhora que passa a ferro, e do supermercado. Vão absorvendo a recém chegada chuva, e ajudando a que o meu correio normal não fique afogado. Ao fim de alguns meses, retiro uma boa camada de pasta de papel, e reparo como a natureza fez de uma simples caixa de correio uma Central Urbana de Reciclagem de Papel, capaz de produzir em poucas semanas uns... vá lá, 100 gramas de pasta de papel para acendalhas (sim, eu faço acendalhas de pasta de papel). E tal como os aparelhos com leitores de mp3 e máquinas fotográficas e cartões de memória e acesso à internet, que têm ainda a surpreendente capacidade de fazer telefonemas, também a minha caixa de correio tem capacidades acima da média, como a de ser um ponto fulcral da minha comunicação com o mundo neste Natal. Lá recebo os meus postais, as correspondências com pessoas que foram para longe, e até algumas ideias perdidas que me fazem crer que Deus continua a oferecer presentes. Oferece em cada instante a oportunidade de nos apercebermos da nossa própria existência, o que é só por si um empurrão para a felicidade.

Sobre o autor

Viajar no tempo, até à altura em que escrevia coisas soltas, sem nexo, vindas lá do fundo do esgoto da minha adolescência e juventude... por vezes pode cheirar mal.

Sobre o leitor

Um perfeito desconhecido, amigo de longa data... uma pessoa 5 estrelas, amigo do amigo, devia abrir-se mais aos outros.