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Nem sei a que horas acordámos. Foi bastante cedo, mesmo sendo uma etapa mais curta. Arrumámos as mochilas e preparámos tudo para partir, uma última vez.
À saída do albergue, ainda falámos com um peregrino português, natural dos açores, que já vinha com 31 dias de peregrinação, no #camino Francés. O plano dele era chegar a Santiago hoje, e depois começar amanhã o #camino Portugues, mas no sentido inverso!, até ao Porto.
Saídos do albergue em direção ao #camino, ainda de noite, parámos junto ao primeiro marco oficial para a oração, e depois embrenhámo-nos no bosque. Continuo sem saber quão cedo era, mas no meio do bosque não se via literalmente nada. Normalmentem, quando caminhávamos no escuro deixávamos os olhos habituarem-se à escuridão durante uns minutos. Mas neste troço, havia muitos mais peregrinos do que estávamos habituados, e todos eles «navegavam» de lanterna, criando pequenas bolhas luminosas ao longo do caminho debaixo das árvores.
Ultrapassámos um grupo de 4 ou 5 mulheres um pouco mais velhas mas nitidamente portuguesas. Foi só uma troca de cumprimentos, e as perguntas habituais do "de onde são?" e "começaram onde?". Não fixei as respostas, penso que eram do norte... talvez Aveiro. Apercebi-me que uma percebeu que éramos de Coimbra em vez de Sintra. Sem problemas, Siga!, que em frente é que é o caminho...

Continuámos a subir uma pequena colina, já com mais luz do dia. Pedrouzo e Santiago ficam quase lado a lado, mas não é possível viajar entre eles em linha recta, pois precisamente no meio fica o aeroporto de Santiago de Compostela. Assim, o caminho faz um desvio para passar a norte do aeroporto, passando bem perto da pista, o que permitiu ainda ver alguns aviões a descolar.
Mais ou menos quando chegámos ao topo norte do aeroporto, o sol estava a nascer. O local tinha uma vista desimpedida para esse espectáculo natural, apesar de a envolvente ser uma autoestrada que estragava um pouco o enquadramento.
Encontrámos nessa zona uma escultura relacionada com Santiago onde muitos peregrinos deixavam objectos, pedras, fotos. Pouco mais à frente passámos por um marco com um aspecto up pouco diferente, marcando o caminho para quem saía do aeroporto a pé, em direção a Santiago.
Houve um momento em que o caminho passou em frente a uma Igreja, e os peregrinos que iam à nossa frente desceram umas escadas para o lado direito. Eu vi um marco oficial do #camino noutra direcção, e uma vez que já estávamos à procura de um local para comer qualquer coisa, assumimos que também aqueles peregrinos iam em busca de um café. Decidimos seguir as indicações do #camino até que conseguíssemos encontrar um estabelecimento junto ao percurso.

Só vários marcos mais à frente percebemos que estávamos a fazer uma variante ao caminho original. Sem problemas... seguimos em frente! Não era um engano daqueles que nos obrigava a voltar atrás.
Numa subida na estrada, encontrámos o Jaime, e aproveitámos para uma foto, pois já chegara o dia das despedidas, e talvez não nos encontrássemos na Cidade.
Um pouco mais à frente, um marco com umas botas... será que alguém decidiu terminar o #camino descalço?
A paragem para comer acabou por ser num barzito anexo a um Camping Peregrinos - um «café com leche» e uma fatia de bolo de laranja tão grande que dava para ser o farnel da uma etapa inteira... e foi, de facto.
Uma coisa que notei nestes 13 dias foi que, tanto nas Astúrias como na Galiza, avistámos pouca fauna. Vimos vários tipos de pássaros diferentes, comuns; milhares de vacas que não contam; umas quintas com ovelhas, alguns locais com cavalos, dois ou três burros. Tirando os lagartos coloridos de Samblismo, e duas pequenas toupeiras pretas, não avistámos mais nada... nem coelhos, nem esquilos, nem veados ou javalis, ursos, raposas, ratos do campo, cobras.... nada. Mesmo sendo grande parte do caminho em zonas bastante naturais, a única forma de vida que víamos frequentemente nos trilhos eram as lesmas, bem gordas e pretas.
Neste último dia, e já nos limites da cidade grande, fui surpreendido - porque olhava para o chão - com um «WOW!» entusiasmado... Algures à nossa frente, foi avistado um animal a cruzar a estrada, aparentemente um veado. Eu não vi, pelo que caminhei ansiosamente até chegar ao ponto do avistamente, tentar procurar ainda sinais de movimento. E vi de facto algum movimento, já longe e no meio de vegetação, pelo que não consegui ver ao certo o que era. Fica classificado com um avistamento de veado, para poder entrar nesta história.
A certa altura, começámos a fazer #camino em conjunto com um grande grupo de miúdos - uma turma de escola ou um grupo de jovens. À porta de uma capela, todos desviaram caminho para a esquerda, mas os marcos continuavam para a direita por isso, seguimos sem eles. Este marco tornou tudo mais interessante para a recta final da peregrinação: dali, já se via ao longe a linha da cidade com as duas torres da Catedral, muito pequeninas, mas a marcarem a sua presença. Já está mesmo ali! A mente navega rapidamente pelos 310 Km que ficaram para trás, e foca-se nos poucos que estão à frente, o verdadeiro desafio do presente.

A descida em direcção da cidade foi ao lado de uma série de edifícios organizados, num espaço arranjado e com grandes jardins. Era o Monte do Gozo, um campo para albergar peregrinos, em grande quantidade, para grupos ou excursões. Para mim, já era conhecido, pois já o tinha visitado no início do século, numa viagem do grupo de jovens.
A paisagem transformou-se gradualmente em Cidade, e a placa que oficializava a entrada em Santiago é um ponto apetecível para as fotos.
Avançámos pela cidade dentro, para depois começarmos a ver a cidade tornar-se mais velha, chegando ao centro histórico. Aproveitei uma igreja aberta para obter um último carimbo (C34), e depois, já se ouvia o som típico do centro daquela cidade, com uma música de fundo em gaita de foles, e a agitação dos habitantes, turistas e peregrinos.
A entrada na praça foi mesmo como um filme. Milhares de pessoas, cada um na sua, uma praça imponente com uma catedral deslumbrande. O momento fica para a memória, muito pelo sentimento de conquista. Na verdade, eu já estive naquela praça por quatro vezes - não me guardava grandes segredos ou surpresas. Mas conquistar o "direito" de chegar ali como peregrino deu um sabor bem diferente.

Tivémos oportunidade de reencontrar alguns dos peregrinos que fomos conhecendo. O romeno, que já não víamos há muito tempo, foi o primeiro. Depois a Andrea, depois os dinamarqueses e o Chase, mais à frente o Jaime...
Agora sim, o relógio re-entrava com força na nossa vida. Havia a urgência de ir tratar da Compostela - a certificação da peregrinação - o que poderia tomar muito tempo. Acabámos por demorar pouco mais de 40 minutos e saímos de lá despachados, com um último carimbo [achava eu] da Oficina do Peregrino (C35).
Depois havia a urgência de tentar chegar a tempo à Missa do Peregrino. Acabámos por entrar a tempo, numa catedral já bem recheada de fiéis, e celebrámos intensamente a Santa Missa, com benção de peregrinos e bota-fumeiro. No final, aproveitando uma fila de espera curta, passámos pelo túmulo do apóstolo. À saída, na lateral da Catedral de Santiago, finalmente um pequeno respirar fundo, para deixar pousar o que já se havia conseguido. Finalmente um abraço. Finalmente a realização!
Mas durou pouco... De seguida veio a urgência de confirmar o ponto onde no dia seguinte teríamos de apanhar o autocarro, numa zona um pouco mais afastada, para sul.
Para acabar, a urgência de arranjar um albergue que fosse perto do centro mas também do terminal rodoviário. Resolvidas as urgências - com mais um carimbo «batoteiro» (C36) do albergue onde fizémos check-in + duche - havia o resto do dia era para desfrutar daquela cidade mágica. Almoçámos, e depois fomos passar a porta santa, aproveitámos para rever a catedral por dentro. Aqui encontrámos o casal de franceses, com quem aproveitámos para tirar uma foto em conjunto.
Comprei uns recuerdos, passeámos pela cidade, parámos numa esplanada para aproveitar o fim de tarde. Na descompressão da aventura, acabámos por ter uma conversa mais profunda sobre quem somos e por onde podemos crescer. Mais uma volta para despedir, vendo o centro já ao anoitecer, e de seguida, fomos para o albergue. Uma última noite em modo peregrino e depois acabou-se.
O saldo para este dia fica em 20.20 Km, os últimos de 320 Km inesquecíveis... agora é acordar!
Na continuação deste artigo, pode querer ler:

O CAMINO - Epílogo

Sobre o autor

Alter-ego: ALCOR :: Procuro estar atento ao mundo, informar-me, ponderar uma opinião... mas entretanto alguém me gamou a password e consegue publicar cenas que eu, apesar de pensar, nunca diria da boca para fora, porque a minha mãe me educou para filtrar estas coisas e eu não a quero desapontar. As reflexões, opiniões e partilhas aqui publicadas não estão autorizadas a sair daqui. «What happens in vegas...»

Sobre o leitor

Um perfeito desconhecido, amigo de longa data... uma pessoa 5 estrelas, amigo do amigo, devia abrir-se mais aos outros.