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Para variar, saímos cedo. Ainda estava escuro quando descemos os 20 metros da porta do alberque à porta da Igreja, onde fizémos a oração. Depois, voltámos a subir esses metros pois o #camino assim o indicava.
A saída da localidade era parecida com a entrada, no outro lado, o que confundia um pouco, mas o sol quase a nascer nas nossas costas indicava que estávamos a seguir a direcção correcta.
Esta etapa está muito ligada à estrada, seguindo sempre muito próximo desta, cruzando várias vezes, partilhando alguns troços. No entanto, foi permitindo andar em bosques e montes com vistas incríveis. Foi das etapas mais bonitas, talvez porque a beleza se revelava logo no início, quando eu ainda estava suficientemente fresco para a apreciar.
Num dos locais onde o caminho se afastava da estrada, havia um parque de merendas bem envolvido no pinhal. Ainda era cedo para parar, portanto seguimos. À distância vi um marco de pedra indicando que o caminho viraria à esquerda, e eu comecei a atalhar através do parque. Fui chamado à atenção que já seguia pelo caminho errado, e logo voltei para ver que o "caminho à esquerda" era um outro, que descia ligeiramente atrás de umas árvores, para dar uma curva acentuada à direita e passar debaixo da estrada. Fiquei com a sensação que se fosse sozinho me teria desviado ali e feito um trecho de caminho errado. Vim a saber mais tarde que o casal de franceses cometeu esse mesmo engano, nesse ponto, deduzo que pelo mesmo motivo. Para eles não foi um «pequeno desvio».
Parámos para comer num local com duas mesas de merendas e uma vista espectacular. Nas palavras de um dos companheiros de viagem. «Nem o Bill Gates tem uma mesa (de trabalho) com uma vista tão incrível». Foi de facto uma sandes com extra sabor.

Normalmente, depois de parar um pouco, sinto logo dificuldade em arrancar novamente. Assim aconteceu, e precisei esforçar-me para voltar a ter ritmo, agora dificultado pelo sol que começava a aquecer. Fiz uma boa parte da fase seguinte da etapa sozinho, no sentido em que me deixei ficar para trás, aproveitei para ir rezando e reflectindo no que estava a viver naquele momento, mas principalmente para procurar viver intensamente o dia 8 de Maio, que seria o aniversário da minha mãe. No sentido metafórico, diria que foi neste dia que travei o meu bom combate; o dia em que a beleza da natureza, da paisagem, do caminho se fundiram com a beleza do presente, da vivência intensa desta viagem, da experiência fraterna. Foi o dia que me virou ao contrário, que me tirou a ideia de superação por mim próprio e me deu a ideia de ser levado ao colo, empurrado, arrastado...
Daqui para a frente, pouco me lembro do caminho. Houve estrada, houve povoações, houve terra batida, e no fim uma recta a perder de vista de estradão, terra batida com pedras, exposta ao sol, para quebrar o meu espírito que ansiava pelo fim da etapa.
Houve tempo de ver, num pequeno eucaliptal mais à frente, uma máquina «demoníaca» de colhia a plantação de eucaliptos... ali, a assistir durante não mais de 2 minutos, vemos uma árvore inteira ser cortada e derrubada, desfolhada e descascada, e seccionada em partes mais pequenas para facilitar o transporte. Tudo em meros segundos. Foi o tema da conversa dali para a frente.

Senti o caminho começar a descer, e logo depois, começamos a ver vestígios de civilização, de povoado.
O albergue municipal era praticamente o primeiro telhado que se via do caminho, portanto antes de sabermos sequer o que era O Cádavo, já estávamos a fazer check-in no albergue (C22). Depois de duche e lavar a roupa, estava fechada a etapa mas não o dia, por isso fomos procurar onde almoçar, seguindo as sugestões de quem nos acolheu. Um bom restaurante, onde outros peregrinos também de restabeleciam, havendo espaço para uma pequena conversa inter-mesas com o casal francês que deu umas dicas ao António sobre o curativo para o dedo do pé que estava em recuperação com gelo. No final da refeição, carimbo (C23) e depois voltámos ao albergue.
A tarde deu para descansar um pouco as pernas, fazer conversa, apanhar a roupa já seca. Mais para o final da tarde, fomos procurar um outro café que nos servisse uns «bocadillos», na ideia de comermos algo mais leve. Aquilo que nos foi servido não era uma refeição leve. Era uma sandes imensa, quase equivalente a pegar num tradicional Pão-da-avó, abrir transversalmente e encher de manteiga, fiambre e queijo. Deu para aquele jantar, e também para o pequeno-almoço do dia seguinte, e o pão - mais cozido, como eu gosto - deu sabor à melhor sandes que comi em todo o caminho.

Depois disto, só havia «espaço» para ir descansar a sério. Como tenho feito nos últimos dias, deixo a bagagem toda pronta para que a partida do dia seguinte seja o mais ágil possível.
O saldo para este dia fica em 25.02 Km, agora é dormir!
Na continuação deste artigo, pode querer ler:

O CAMINO - Capítulo IX: O Cádavo - Lugo

Sobre o autor

Alter-ego: ALCOR :: Procuro estar atento ao mundo, informar-me, ponderar uma opinião... mas entretanto alguém me gamou a password e consegue publicar cenas que eu, apesar de pensar, nunca diria da boca para fora, porque a minha mãe me educou para filtrar estas coisas e eu não a quero desapontar. As reflexões, opiniões e partilhas aqui publicadas não estão autorizadas a sair daqui. «What happens in vegas...»

Sobre o leitor

Um perfeito desconhecido, amigo de longa data... uma pessoa 5 estrelas, amigo do amigo, devia abrir-se mais aos outros.