Espaço

5 blogs pelo preço de 1 gratuito

O CAMINO - Capítulo XII: Melide - Pedrouzo

Acordamos cedo, mais cedo que os outros dias... mais cedo até que o previsto. Entre acordar muitas vezes com o barulho de camiões que passavam na estrada à porta do albergue, e não conseguir adormecer com o ressonar nos vizinhos, acabei por sair da cama meia hora mais cedo, e isso ditou que começaríamos a jornada mais cedo.
Saímos de noite, procurámos uma flecha oficial e fizemos a oração. Depois seguimos pelo caminho indicado pelo dono do albergue, com a sugestão de aproveitar a vista no alto da igreja. Tudo espectacular não tivéssemos feito isto à noite, altura em que nem via onde punha os pés.
A jornada para hoje foi a mais longa de toda a peregrinação: prevíamos 33 km, não sabendo se seria um terreno fácil ou difícil. A primeira fase feita por trilho rural, permitiu passar uma ponte de pedras para ultrapassar um pequeno riacho no meio do bosque. Seria local perfeito para fotos, não fosse o mesmo problema: ainda estava muito escuro.
Encontrámos uma encruzilhada onde podíamos escolher entre o caminho original e uma variante. Nesta encruzilhada e em outras que fomos encontrando mais à frente, escolhemos sempre o caminho original. Passámos uma igreja de Santiago, ainda fechada, e voltamos ao vale no meio do bosque.
O troço seguinte era estrada, que se transformou e ambiente urbano ao levar-nos por dentro de uma povoação chamada Arzua. À saída desta vila, duas irmãs à porta de um edifício, «ofereciam» o carimbo aos peregrinos. Entreguei a credencial meio distraído e recebi de volta dois carimbos de uma assentada (C30 & C31).
Depois seguimos pelo bosque. A certa altura percebemos que estávamos a passar por um ponto onde muitos escolhiam iniciar a peregrinação. Começamos a sentir os caminhos mais cheios de peregrinos, muitos deles em grupos grandes que faziam as últimas etapas em modo organizado por alguma agência que lhes garantia autocarro, transporte de malas e, mais perto do final da manhã , o restaurante onde almoçariam.
O nosso caminho não se interrompeu nem se atrapalhou. Chegamos a conversar com algumas pessoas de um grupo de americanos. Depois, voltando à estrada, enveredámos por um caminho lateral, à sombra. As sombras ajudam muito a vencer as etapas de calor, mas o chão de pedras duras e soltas era o meu inimigo.

Estávamos a chegar à povoação, a bater os 33km, quando fomos abordados por voluntário com o único propósito de divulgar as missas da paróquia, e desafiar os peregrinos a manterem a vertente espiritual e religiosa como centro dos seus dias. A mensagem mais dolorosa foi que ainda faltariam 1,5 km para chegar ao albergue, numa altura em que os meus pés já gritavam por terminar. Foi um último quilómetro feito em conjunto com os dinamarqueses.
Chegados a Pedrouzo - que afinal é a Paróquia chamada Arca - fomos para o albergue fazer o check-in (C32), tomar duche, lavar roupa e sair à procura de lugar para almoçar. Sentados numa mesa da esplanada, junto à estrada, recebemos o Chase, o americano que se associava quase sempre o grupo dos 5 dinamarqueses que conhecemos logo na primeira etapa. Fizémos a refeição juntos, e trocámos algumas impressões do que já foi vivido e do que faltava.
Acabámos de almoçar e fomos descansar para o albergue. Ao final da tarde fomos à missa, na Igreja Paroquial de Arca, bastante concorrida - aparentemente o desafio lançado à entrada tinha dado frutos - com peregrinos de muitas origens. A caminheira da igreja, não muito grande, apontava de forma tradicional para um altar, dois degraus mais alto que a zona da assembleia, e na parede de fundo do presbitério, uma enorme Concha criava a envolvente do Sacrário, de forma deslumbrante.
No final da missa, uma pequena fila para obter um carimbo na credencial (C33). Fomos depois comer umas sandochas a um café, e finalmente fomos descansar.

É certo que este era o último albergue onde ficávamos nesta peregrinação, mas o tamanho do mesmo (provavelmente mais de 60 camas) levou à incontornável redução de respeito mútuo, e por isso adormecer revelou-se mais difícil, com tanto barulho e tanta luz. Obviamente que o cansaço prevaleceu.
O saldo para este dia fica em 34.78 Km, agora é dormir!
Acordamos cedo, descemos para aproveitar o pequeno almoço incluído e partimos. Para trás ficou o Tó, depois de 8 etapas feitas em conjunto.
O albergue era no meio do nada, e foi no meio desse nada, junto a um marco do Camino, que fizemos a oração. E assim iniciamos a etapa com destino - Melide.
Apesar de termos o albergue já reservado, a pressa - relativa - era evitar muito sol, já que a jornada era relativamente longa.
Nestes concelhos que atravessámos nas primeiras horas, avistámos mais que uma vez mapas parciais da etapa de hoje, referentes à intersecção do município. Isso partiu a jornada em segmentos mais pequenos, o que psicologicamente era reconfortante, pois ajuda ir vendo pequenos milestones serem atingidos - dividir para conquistar.
Foi assim por uma parte do caminho. Passamos uma velha ponte Romana, conhecemos um par de espanhóis, fomos caminhando pela fresca.
A certa altura torna-se claro que vamos fazer um pequeno segmento pelos montes, subindo uma colina e contornando uma serrania cheia de geradores eólicos. Deu para ver que aquele monte estava a obrigar a um qualquer fenómeno atmosférico, e no seu topo viam-se fiapos de nuvens a passar rápido pelo cume e a formar nuvens mais altas.

Ao contornar esse mesmo monte, mergulhamos na dita nuvem, num nevoeiro que transformava em meros vultos os peregrinos que caminhavam 50 metros à nossa frente.
Passamos por uma esplanada cheia, cheia demais, por isso continuámos e parámos na seguinte. Deu para beber uma aquarius e usar os aseos. Na esplanada, ficámos junto dos dinamarqueses, que andavam sempre mais depressa, mas aparentemente paravam mais vezes, e por isso nos cruzámos tantas vezes. A simples pergunta “então porque decidiram fazer o camino?” transformou-se numa história logo na curta resposta começada por “bem, o não-sei-quantos estava bêbado...”
Já perto de Melide, passamos uma placa de povoação com o nome Compostela. Curioso.
A recta final já permitia ver a torre da igreja e a estrada transformada em avenida citadina. Encontramos o David e as espanholas num café, e dali fomos procurar o albergue onde tínhamos reserva. 

Feito o check-in (C28) por um senhor que me pareceu uma versão mais velha e afável do Xavier de Samblismo, o espaço foi-nos apresentado ao pormenor, e rapidamente percebemos que havia uma forte ligação entre ele e o #camino.
Fomos procurar almoço, encontrámos o Gilberto e um espanhol que nos informaram haver muitas vagas no albergue municipal, mas logo voltou o tema dos albergues cheios na etapa seguinte.
Enquanto almoçávamos, soubemos que o António afinal tinha vindo até Melide, portanto lá o chamámos para a comezaina e mais um brinde! De seguida visitámos a igreja, onde aparentemente iria haver uma missa de corpo presente, e aproveitámos para pedir mais um carimbo (C29).

À tarde fomos ao supermercado comprar coisas para o dia seguinte, e voltamos ao albergue. Ao final da tarde, ficou-me marcado o gesto do dono do albergue em ir despedir-se pessoalmente de todos os hóspedes, desejando «buen camino».
Depois de arranjarmos as sandes para o dia seguinte, jantámos uma empadanilha e fomos sair para beber um copo - a despedida do António: take 3. Este teve o azar de ficar com o cartão retido na máquina... seria preocupação para o dia seguinte. Bebemos uns copos e voltamos para o albergue para descansar.
O saldo para este dia fica em 28.28 Km, agora é dormir!
Esta noite foi complicada... entre estar de nariz entupido, sentir com um mal-estar generalizado, haver janelas que não foram tapadas com os cortinados, e malta a ressonar, o descanso foi intermitente. Acordei abananado, arrumei a tralha e fiz-me à saída.
Quando estávamos prontos a sair, tínhamos duas “questões” pendentes para resolver: primeiro, tive de inteirar o “sôr Vitor” da «história da joelheira»5, que espoletou uma cadeia de contactos via redes sociais para localizar o dono; em segundo, o “ferreira” prometeu esperar por uma pessoa para garantir que a porta do albergue estava aberta, pessoa essa que não apareceu dentro da margem de tolerância.
Ultrapassados estes pontos, arrancámos! Atravessámos as praças do centro histórico, assistimos às operações de limpeza e descobrimos mais duas ou três atrações para fotografar no lusco-fusco da madrugada.
Chegados à catedral de Lugo, fizemos a oração e deixamos o centro muralhado pela Porta de Santiago. Lugo é uma cidade grande em comparação com todas as povoações por onde passámos até agora, mas não tão grande como Oviedo, por isso em apenas alguns minutos atravessámos os bairros da cidade e chegámos ao rio que a delimita naturalmente.
Passamos por uma ponte com indicação de estarmos na Via Romana XIX, e admirámos as águas calmas num leito largo do rio Minho (Miño), tão antes de se tornar Português.
A subida do outro lado, numa colina pouco acentuada, foi feita à luz do nascer do sol, que revelava, ao olharmos para trás, o horizonte definido por Lugo, já a alguma distância, e com cores acentuadas de vários tons, entre azuis e amarelos.
O resto do caminho deste dia foi literalmente seguir ao longo de uma estrada, que tinha uma berma minimamente arranjada para convidar os peregrinos a evitarem o alcatrão. Foram quilómetros desta estrada, a ver o horizonte ao longe, sem mudar muito de aspecto. Não sendo uma etapa feia, ou que passasse em zonas poluídas ou industriais, também não era propriamente um assombro de beleza desmedida. Valeu a companhia e a conversa, para distrair do cansaço e dos ameaços de doença.
À passagem por um casario, um «negócio da china»: um espaço com vending-machines variadas, para chocolates, bolos, bebidas e café, para os peregrinos se servirem. Depois de uma moeda na máquina do café que resultou numa bica servida sem copo, e portanto, para o lixo, restava somente usufruir do carimbo (C26) e seguir.
Já tínhamos percorrido a maior parte dos quilómetros até ao destino e ainda era cedo para chegar ao albergue, pelo que desviámos 100 metros da estrada para ir beber uns copos. Quando voltámos ao caminho, bastaram meia dúzia de passos para passarmos num marco romano imponente, e logo à frente a algazarra de uma outra esplanada cheia de peregrinos. Aqui encontrámos o David, o Gilberto e mais alguns dos espanhóis.
Chegámos cedo ao albergue, um albergue privado que tínhamos reservado no caminho. Demos entrada (C27) e fomos à dança do tomar-banho-lavar-roupa-e-pensar-no-almoço. O albergue não ficava bem na povoação - ou a povoação era mesmo só aquilo, talvez - pelo que o almoço foi nas instalações do albergue, e não houve passeios para ir ver as atrações mais turísticas. Depois do almoço deu para descansar um pouco na camarata, sendo acordado pelo som distante de uma guitarra que duvidei vir do jardim exterior - talvez fosse o eco de um qualquer sonho, já esquecido e desaparecido no meu despertar.
Descemos para beber uns copos ao final da tarde, e vi - de facto - uma guitarra nas mãos de um peregrino com quem já nos tínhamos cruzado - era um casal que nitidamente não falavam outra língua que não a sua, aparentemente alemão. Quando tive a minha oportunidade, pedi a guitarra emprestada para tocarmos umas coisas na esplanada. Acabámos por tocar em conjunto com o Christian - afinal eram polacos - com quem pouco ou nada conversámos devido à barreira linguística. Somente partilhámos música, alguns «covers» que pudessem ser reconhecidos, ou músicas nativas de cada país a serem apresentadas mutuamente.
O jantar foi no mesmo sítio, regado com «pânico», gerado pela notícia que em Melide os albergues estavam completamente cheios. Acabámos por ligar a alguns dos privados que tínhamos listado com antecedência e conseguimos (ao terceiro) garantir uma vaga.
Resolvido esse stress, lá fomos descansar. Tempo para nos despedirmos do António, que no dia seguinte sairia mais tarde, e não daria pela nossa saída madrugadora.
O saldo para este dia fica em 20.68 Km, agora é dormir!

O CAMINO - Capítulo IX: O Cádavo - Lugo

Acordei no dia de hoje com a sensação que o fim está próximo. Não o «fim dos tempos», mas o fim desta viagem. Como assim, já passaram 8 dias? Provavelmente é a negatividade típica das minhas segundas-feira. Afinal de contas, ainda há 5 etapas por fazer, 3 das quais são das mais longas de toda a jornada.
Lá vamos nós, mochilas às costas, antes de o sol nascer. Atravessamos a povoação e procuramos a primeira indicação oficial para fazer a nossa oração do peregrino. Depois é caminhar. A etapa de hoje assusta por ser das mais longas: serão mais de 30km, algo que até aqui ainda não fizémos.
O início era a subir, já o sabíamos. Subir até Castro Verde, onde fomos ao café beber uma Aquarius para re-hidratar. Um pouco mais à frente, parámos para comer as sandochas, junto a um cruzeiro e um cemitério - «vista para o futuro».
Hoje estava previsto ser o último dia que caminharíamos com o António! Como o objectivo dele é chegar no Sábado, e o nosso é chegar na 6a feira, ele planeou de fazer 6 etapas enquanto nós fazemos 5. Assim, ele não tinha planeado ir até Lugo, mas previa parar em Carballido.
Quando passámos nessa zona, o caminho não passava no meio dessa povoação e não havia indicações nenhumas para o albergue, por isso fomos avançando, até que a ideia de seguir até Lugo se fixou, e assim acabámos mais uma etapa em conjunto. Relembrar que o conhecemos em Grado, caminhou connosco uma parte da etapa Salas-Tineo, e depois disso, fizémos praticamente todo o caminho juntos.

A chegada a Lugo, uma cidade grande, tem uma envolvente pouco interessante e por isso de pouco me lembro. A etapa «grande» foi feita em gestão de esforço, e por isso passei muito tempo a olhar para o chão. A água do meu cantil estava a acabar, pelo que já nos arredores da cidade meti conversa com um casal que estava no seu quintal a regar as plantas, para pedir um «refill», prontamente cedido.
Foi já dentro da cidade, para nossa surpresa, que passámos o «famoso» ponto do Km100. Faltam portanto 100 Km para o nosso destino. Este ponto está numa praça que exalta bem esse «milestone». Com o resto das forças, arrastei-me pela encosta acima, até ao centro da cidade que fica dentro de uma muralha. Entrámos pela porta de São Pedro, e o albergue era «logo ali»...

Em poucos minutos fizémos o check-in (C24) e largámos as mochilas. O resto do dia seria para conhecer a cidade, que é uma cidade bem bonita e antiga. No entanto, o meu corpo pedia descanso. Fomos almoçar por ali perto, e depois fui para o albergue dormir um pouco. Nesta altura estava com alguma tosse e senti-me um pouco febril. Ter visto nas notícias que havia uma nova estirpe de COVID nas Astúrias levantou alguma preocupação.
Ao final da tarde, acordei e fomos ao supermercado fazer umas compras para o jantar e para o dia seguinte. Depois fui explorar o que ainda era possível conhecer na cidade. A Catedral de Santa Maria já estava fechada, mas a Igreja de Santiago estava aberta, o que deu para mais um carimbo (C25). Explorámos uma pequena parte da muralha, as praças mais centrais que a esta hora se enchem de locais nas esplanadas.

De volta ao albergue, fomos preparar as sandes do dia seguinte e jantar qualquer coisa. Conhecemos uma senhora mais velha, holandesa, que tinha iniciado o seu #camino na holanda, em 2019, já percorrera França, e em Espanha teve de interromper por causa da pandemia, pelo que só agora iria completar a caminhada. Já havia feito parte do Camino do Norte, inflectindo depois para o #Camino Primitivo, onde nos encontramos.
Depois deste pequeno momento de jantar e conversa, fomos descansar.
O saldo para este dia fica em 30.31 Km, agora é dormir!
Para variar, saímos cedo. Ainda estava escuro quando descemos os 20 metros da porta do alberque à porta da Igreja, onde fizémos a oração. Depois, voltámos a subir esses metros pois o #camino assim o indicava.
A saída da localidade era parecida com a entrada, no outro lado, o que confundia um pouco, mas o sol quase a nascer nas nossas costas indicava que estávamos a seguir a direcção correcta.
Esta etapa está muito ligada à estrada, seguindo sempre muito próximo desta, cruzando várias vezes, partilhando alguns troços. No entanto, foi permitindo andar em bosques e montes com vistas incríveis. Foi das etapas mais bonitas, talvez porque a beleza se revelava logo no início, quando eu ainda estava suficientemente fresco para a apreciar.
Num dos locais onde o caminho se afastava da estrada, havia um parque de merendas bem envolvido no pinhal. Ainda era cedo para parar, portanto seguimos. À distância vi um marco de pedra indicando que o caminho viraria à esquerda, e eu comecei a atalhar através do parque. Fui chamado à atenção que já seguia pelo caminho errado, e logo voltei para ver que o "caminho à esquerda" era um outro, que descia ligeiramente atrás de umas árvores, para dar uma curva acentuada à direita e passar debaixo da estrada. Fiquei com a sensação que se fosse sozinho me teria desviado ali e feito um trecho de caminho errado. Vim a saber mais tarde que o casal de franceses cometeu esse mesmo engano, nesse ponto, deduzo que pelo mesmo motivo. Para eles não foi um «pequeno desvio».
Parámos para comer num local com duas mesas de merendas e uma vista espectacular. Nas palavras de um dos companheiros de viagem. «Nem o Bill Gates tem uma mesa (de trabalho) com uma vista tão incrível». Foi de facto uma sandes com extra sabor.

Normalmente, depois de parar um pouco, sinto logo dificuldade em arrancar novamente. Assim aconteceu, e precisei esforçar-me para voltar a ter ritmo, agora dificultado pelo sol que começava a aquecer. Fiz uma boa parte da fase seguinte da etapa sozinho, no sentido em que me deixei ficar para trás, aproveitei para ir rezando e reflectindo no que estava a viver naquele momento, mas principalmente para procurar viver intensamente o dia 8 de Maio, que seria o aniversário da minha mãe. No sentido metafórico, diria que foi neste dia que travei o meu bom combate; o dia em que a beleza da natureza, da paisagem, do caminho se fundiram com a beleza do presente, da vivência intensa desta viagem, da experiência fraterna. Foi o dia que me virou ao contrário, que me tirou a ideia de superação por mim próprio e me deu a ideia de ser levado ao colo, empurrado, arrastado...
Daqui para a frente, pouco me lembro do caminho. Houve estrada, houve povoações, houve terra batida, e no fim uma recta a perder de vista de estradão, terra batida com pedras, exposta ao sol, para quebrar o meu espírito que ansiava pelo fim da etapa.
Houve tempo de ver, num pequeno eucaliptal mais à frente, uma máquina «demoníaca» de colhia a plantação de eucaliptos... ali, a assistir durante não mais de 2 minutos, vemos uma árvore inteira ser cortada e derrubada, desfolhada e descascada, e seccionada em partes mais pequenas para facilitar o transporte. Tudo em meros segundos. Foi o tema da conversa dali para a frente.

Senti o caminho começar a descer, e logo depois, começamos a ver vestígios de civilização, de povoado.
O albergue municipal era praticamente o primeiro telhado que se via do caminho, portanto antes de sabermos sequer o que era O Cádavo, já estávamos a fazer check-in no albergue (C22). Depois de duche e lavar a roupa, estava fechada a etapa mas não o dia, por isso fomos procurar onde almoçar, seguindo as sugestões de quem nos acolheu. Um bom restaurante, onde outros peregrinos também de restabeleciam, havendo espaço para uma pequena conversa inter-mesas com o casal francês que deu umas dicas ao António sobre o curativo para o dedo do pé que estava em recuperação com gelo. No final da refeição, carimbo (C23) e depois voltámos ao albergue.
A tarde deu para descansar um pouco as pernas, fazer conversa, apanhar a roupa já seca. Mais para o final da tarde, fomos procurar um outro café que nos servisse uns «bocadillos», na ideia de comermos algo mais leve. Aquilo que nos foi servido não era uma refeição leve. Era uma sandes imensa, quase equivalente a pegar num tradicional Pão-da-avó, abrir transversalmente e encher de manteiga, fiambre e queijo. Deu para aquele jantar, e também para o pequeno-almoço do dia seguinte, e o pão - mais cozido, como eu gosto - deu sabor à melhor sandes que comi em todo o caminho.

Depois disto, só havia «espaço» para ir descansar a sério. Como tenho feito nos últimos dias, deixo a bagagem toda pronta para que a partida do dia seguinte seja o mais ágil possível.
O saldo para este dia fica em 25.02 Km, agora é dormir!



Pág. 12 de 37

Sobre o autor

Talvez tenha demasiado tempo livre, e invente por 5 pessoas diferentes... pelo menos não ando nas drogas. E não, não sofro de esquizofrenia!, embora tenha muitas faces diferentes... Tenho uma paixão por astronomia, um forte interesse por informática, um perfil para (não) ser pai, uma família «out-of-my-league», uma visão distópica da sociedade, uma mania que tenho piada, uma educação conservadora, uma introversão crónica acentuada, um sonho de ser aceite.

Sobre o leitor

Um perfeito desconhecido, amigo de longa data... uma pessoa 5 estrelas, amigo do amigo, devia abrir-se mais aos outros.